Muitas
vezes nos questionamos por que algumas pessoas, aparentemente normais,
aparentam retardo mental no momento de expor e emitir suas opiniões. Alguns,
por exemplo, se surpreendem com a facilidade com que encontramos falhas e
truques desonestos no discurso neo ateu, mas geralmente esse material surge
muitas vezes das mãos de pessoa acadêmicas. Ou seja, não são clinicamente
dementes. Mas agem como se fossem. Há de tudo, incluindo falácias, erros
lógicos básicos, pensamento limitado por frases incompletas (por exemplo, é
dita uma frase “ele crê”, com omissão da sequência, o que deixa o objeto de
crença não especificado e tira todo o sentido da asserção), erros de categoria
e coisas do tipo. Temos que investigar esse fenômeno, pois determinados erros
podem gerar conseqüências. Podemos até achar graça ao ver alguém falando
bobagem o tempo todo, mas o assunto é mais sério do que parece. Eis então que
esbocei uma teoria que complementa a teoria da espiral do silêncio, criada por
Elisabeth Noelle-Neumann, no início dos anos 70, para explicar os efeitos dos
meios de comunicação de massa.
A Espiral do Silêncio
Elisabeth Noelle-Neumann
notou uma alteração na mudança de opinião dos eleitores quando a reta final de
um processo eleitoral sob estudo tomou corpo. Ela mostrou que uma boa parte dos
eleitores se aproximava de opiniões que julgavam dominantes. Nessa análise, o
grupo que obtem a vantagem não é aquele que possui a hipótese ou abordagem mais
correta, mas sim o que possui mais: (1) Impressão perante a opinião pública de
que sua opinião é a “certa”, ou que se está no caminho certo; (2) Crença dos
defensores desta opinião na vitória (o que aumenta a confiança); (3) Motivação
dos defensores desta opinião no ato de lutarem por sua opinião. Com isso,
entende-se que muitas vezes grupos que mostrem os fatores (1), (2) e (3) vão
obter a aceitação de uma grande massa de indecisos, ou seja, daqueles que “vão
com a maioria”. Outro ponto interessante, e que ocupa lugar central na teoria:
aqueles que sentem-se distantes dos pontos (1), (2) e (3), mesmo que estejam
com a razão, tendem a SE CALAR. Esses que se calam são o que entram na espiral
do silêncio. Isso explica por que grupos militantes, como os adeptos das causas
gayzistas e neo ateístas, obtem resultados maiores do que os grupos cristãos,
que não executam a militância. Como se vê, a militância é um ato para jogar o
seu oponente na espiral do silencio. Elisabeth mostrou vários resultados
estatísticos comprovando que a fórmula se aplica sempre que existe a luta pela
“opinião pública”. Podemos até dizer que Antonio Gramsci quando elaborou a sua
Estratégia Gramsciana, estava tão apenas estudando uma forma de jogar os seus
oponentes na espiral do silêncio. Só que Gramsci não tinha um modelo teórico
para explicar o fenômeno. Ele apenas elaborou um modelo de “como chegar lá”. A
explicação do fenômeno, feita de forma cientifica, coube a Elisabeth. Ela
também ampliou a explicação para definir o motivo pelo qual alguém fica preso
na espiral do silêncio. A idéia central nessa abordagem diz que alguns agentes
sociais podem ser isolados de seus grupos de convívio caso emitam opiniões
diferentes daquelas que o grupo considere como opiniões dominantes. Com isso, o
medo do isolamento (o afastamento do convívio social) torna-se a principal
força motriz para acionar o gatilho da opinião pública, pois os agentes sociais
percebem o clima da opinião.
Vamos resumir, então, os
pontos principais componentes que habilitam os efeitos da espiral do silêncio
1. Medo da rejeição pelos
que o rodeiam;
2. Monitorização dos
comportamentos, de forma a observar quais são os aprovados e os reprovados
socialmente, (em grupo);
3. Há gestos e expressões
que, sem fala, expressam a aprovação ou não de determinada ideia,
comportamento;
4. Tendência para não
expressar a sua opinião publicamente quando há possibilidade de rejeição,
objeções ou desdém;
5. Quando se conclui que
a opinião é aceita, a tendência é expressá-la com convicção;
6. O falar livremente de
determinado ponto de vista reforça ainda mais a ideia de isolamento, por parte
daqueles que defendem a opinião contrária;
7. Este processo apenas
ocorre nas situações em que há uma questão moral forte – é a componente moral
que dá poder à “opinião pública”;
8. Só questões
controversas podem ativar a “Espiral do Silêncio”;
9. Nem sempre o ponto de
vista mais forte é o defendido pela maioria da população;há o medo de o admitir
publicamente;
10. A mídia de massa pode
influenciar, e muito, o processo da “Espiral do Silêncio”, quando numa questão
moral tomam determinada posição e exercem influência no processo;
11. As pessoas não se
apercebem do medo dos outros e da questão do isolamento;
12. A “Opinião Pública” é
limitada no tempo e no espaço – a “Espiral do Silêncio” apenas se verifica
durante um período de tempo limitado; este processo tende também a ser limitado
pelas fronteiras geográficas e culturais;
13. A “Opinião Pública”
serve como instrumento de controle social, mas também de coesão social.
A Espiral da Bobagem
Tudo que Elisabeth nos
traz, no entanto, só explica o PROCESSO de criação da espiral do silêncio.
Enfim, é o meio pelo qual um grupo político ao defender sua opinião, e mesmo
que não tenha razão, faça um grupo oposto SE CALAR. A teoria da espiral do
silêncio termina por aí. Mas ela não nos explica o motivo pelo qual o grupo
dominante começa a perder todos os parâmetros racionais em seu discurso. Isso é
o que farei agora, tomando por base a espiral do silêncio.
Na parte 3 desta série,
eu falei do controle de qualidade argumentativo. A idéia do controle de
qualidade argumentativo envolve a checagem e a investigação de um conteúdo
argumentativo a ser feito por qualquer outro grupo QUE NÃO AQUELE envolvido com
a elaboração do argumento. Ou seja, o argumento de um marxista não pode ser
validado independentemente por um marxista, assim como o argumento de um
conservador não pode ser validado por um conservador, e assim por diante. É o
mesmo princípio pelo qual nas organizações a peça produzida por um torneiro
será avaliada por alguém do controle de qualidade, com uma função DIFERENTE da
função que produziu a peça. O motivo é bastante óbvio: evitar conflitos de
interesses. Há até uma disciplina, chamada segregation of duties, que separa os
papéis que podem executar determinadas transações nas empresas. Como exemplo,
alguém que vai obter um benefício por ter uma proposta comercial aprovada NÃO
PODE participar do processo decisório para aprovar esta proposta. Para
argumentos, o processo funciona da mesma forma. Um grupo que obterá os
benefícios de uma ideologia não é aquele que irá encontrar os erros na
ideologia, mas sim colher os frutos da implantação da ideologia. A missão de
identificar os erros na ideologia é de um grupo OPOSTO à ideologia.
Vamos a uma pequena matriz para exemplificar:
• O discurso de um
marxista deve passar por uma checagem de erros por um conservador
• O discurso de um
conservador deve passar por uma checagem de erros por um marxista
• O discurso de um
liberal deve passar por uma checagem de erros por um conservador, e vice-versa
• O discurso de um ateu
deve passar por uma checagem de erros feita por um cristão
• O discurso de um
cristão deve passar por uma checagem de erros feita por um ateu.
Na prática, isso seria
apenas o segregation of duties e o controle de qualidade aplicado à atividade
argumentativa. Naturalmente, ele não seria executado de uma maneira tão formal,
com um checklist, mas a mera elaboração de uma série de textos mostrando os
erros lógicos da outra parte já estabelece esse controle. E seguindo os
princípios do controle de qualidade corporativo, a partir do momento em que não
há o controle de qualidade institucionalizado, o produto gerado (no caso da
argumentação, o argumento é o produto) perde qualidade de forma exponencial.
Essa queda de qualidade vista nos produtos de uma empresa (que cai de um 6
Sigma para um 2 Sigma, por exemplo) é similar ao que em uma argumentação
chamaríamos de “falar só bobagem”. Mas por que isso acontece? A resposta está justamente
na espiral do silêncio: o grupo que faria o controle de qualidade SE CALOU.
Então, o grupo que agora pode falar à vontade, sem ninguém para o censurar,
começa a aumentar o nível de bobagem ao nível do absurdo, pois ele está obtendo
os efeitos, que é impor a sua opinião e vencer o outro grupo politicamente. Se
a meta é basicamente essa vitória política, e as bobagens podem ser proferidas
(e inclusive planejadas para gerar mais dano ao oponente), a tendência é que
eles façam isso mesmo. É por isso que é fácil encontrar 27 erros grotescos em
um discurso de 9 minutos de Richard Dawkins. Ele está na espiral da bobagem,
enquanto os cristãos estão na espiral do silêncio. O silêncio dos cristãos
ingleses em relação às bobagens ditas por Dawkins o habilitam a dizer qualquer
coisa (QUALQUER COISA MESMO), independente de passar por um freio lógico, desde
que gere resultados, o que para ele é a estipulação de preconceito contra os
religiosos nos mesmos moldes que era o anti-semitismo de Hitler. Claro que essa
idéia não só pode como deve ser testada, mas os extensivos testes de uso ou não
do controle de qualidade nas organizações já dão forte sustentação à teoria.
Com essa idéia, entendemos muito da ação de grupos que falam verdadeiras
sandices após o grupo oponente se calar. Com essa teoria, podemos dimensionar o
altíssimo risco que é ter um país sem oposição ao governo atual, por exemplo.
Fazer um grupo se calar, utilizando a espiral do silêncio, é simplesmente a
implementação do direito de poder fazer qualquer coisa, pois aquele que se
calou é o ÚNICO que iria censurar publicamente este grupo no ato de falar
bobagens.
Vamos definir os dois grupos então:
• Espiral do Silêncio:
Espaço ocupado por um grupo ideológico que se CALOU perante a atuação de um
outro grupo, considerado ser dominante ideologicamente
• Espiral da Bobagem:
Espaço ocupado por um grupo ideológico que obtem o direito de dizer qualquer
bobagem, pois o único grupo que deveria monitorá-lo SE CALOU.
Monitorando a espiral do silêncio e a espiral da bobagem
Esta concepção divide
muitos cenários atuais em “fatias”, em termos ideológicos de debates
polarizados. (Quando não há polarização, a espiral do silêncio não se aplica,
portanto a espiral da bobagem também não). Hoje em dia, no Brasil, muitos conservadores
estão na espiral do silêncio. Isso está garantindo a eleição de Dilma, mesmo
após uma série de atos de corrupção. Novamente explicado pela espiral do
silêncio e a espiral da bobagem. Os conservadores estão na espiral do silêncio,
e os esquerdistas do PT estão na espiral da bobagem. Portanto fazem o que
quiserem, pois o grupo que iria censurá-los em público se calou. No cenário de
duelos religiosos, é a mesmíssima coisa. Mesmo em maior quantidade, os
religiosos, talvez por querer desistir da baixaria que é o discurso
anti-religioso, se calaram. Alguns poucos ainda tentam revidar, mas com uma
elegância suficiente para não conseguir “quebrar” a espiral. A “quebra” da
espiral reside na QUEBRA da autoridade da outra parte. A outra parte, que está
na espiral da bobagem, tenta obter uma autoridade que não tem, através de sua
militância e discurso de baixo nível (planejado para que a outra parte se
cale). Por isso, hoje os neo ateus descem de nível de forma absurda, pois isso
ajuda a manter muitos cristãos na espiral do silêncio. E é justamente onde há o
risco de achar que se o “outro fala bobagem, não há problema”. Uma série de
leis judiciais (incluindo leis pró-aborto, ou leis contra a religião) é obtida
por que os cristão estão perdendo pontos em política POR PERMITIREM que o outro
lado o mantenha na espiral do silêncio. Quando eu defendo neste blog a reação
firme, com atos de desmascaramento (e não o discurso polido cheio de fleumas) e
exposição de fraudes, essa é a única atitude que quebraria a espiral do
silêncio. A missão do cristão (assim como do conservador) é sair da espiral do
silêncio. Pois o outro lado está na espiral da bobagem, falando tudo que quer
para OBTER BENEFÍCIOS POLÍTICOS. Curiosamente, temos aqui uma grande
oportunidade. Pelo fato do grupo religioso estar na espiral do silêncio por
tanto tempo, o grupo da esquerda e da anti-religião da mesma forma está na
espiral da bobagem. Por isso, falam tanta bobagem.
Neste site
(http://lucianoayan.com/, por exemplo, eu simplemesmente disseco as bobagens
que eles falam, de forma padronizada. A criação da consciência nos cristãos e
conservadores do fato de que estes estão na espiral do silêncio (e o seu
adversário está na espiral da bobagem), permite que se crie um novo modelo de
atuação, que é aquele defendido aqui. As bobagens faladas pelo adversário devem
ser expostas, para que aos poucos seja retirada a falsa autoridade que eles
tentam nos impor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário